Lua Escura - Parte 9

Finalmente uma nova ordem se formará... Depois de tanto tempo, diremos adeus a tudo que aquilo que nos atrasa, que nos prende a este maldito mundo de dor. Não há erro a partir daqui...
Está chegando a hora da vingança. Está chegando a hora de eu ver todo aquele sangue derramado aos meus pés. Já esperei o suficiente... Eu te pegarei, maldita semente Crommwell, e sugiro que comece a correr!
O tempo está passando... Não vou mais poupá-la pelos fracos sentidos de Paul...

--------------------------- Marianne, a alguns metros de uma das entradas de Boston:

— Me passe a pistola! — Suplicou-me o ser de casaco branco e jeans escuros que se encontrava de joelhos ao meu lado enquanto encarava o grande caminhão virado que permanecia largado à pelo menos dez metros de distância de nós.
— Quantas vezes eu terei de lhe dizer? — Perguntei retoricamente. — São encarnados. simples balas como estas não surtirão efeito algum...
Estávamos ambos agachados atrás de um simples carro, provavelmente largado por alguma família desesperada, observando atentamente tudo ao nosso redor que fosse capaz de se mover. Burnstein, com toda sua pelagem negra brilhando sob a luz do luar, estava a alguns passos à frente, permanecendo sentado em cima de outro veículo abandonado, tão ligado ao ambiente quanto nós.
— O que faremos então? — a voz de Matt soava agora mais preocupada do que antes, e seus cabelos vermelhos eram vítimas de suas mãos nervosas, que viviam o alisando.
— Eu não sei.
— Lá estão! — Gritou uma terceira voz vinda de trás do grande caminhão que bloqueava a rua, diretamente da garganta de uma mulher gorda com cabelo loiro que apontava para nós.
Foi então que tudo começou a acontecer. Um grande grupo, provavelmente de umas vinte ou vinte e cinco pessoas, deixou os diversos esconderijos utilizados ao longo da estrada, tomando todos um único caminho com impressionante velocidade e fúria estampada nos olhos.
— Burnstein! — gritei, ao mesmo tempo em que o rapaz ao meu lado dizia “Thross” em um tom de voz tão alto quanto o meu.
O gato preto saltou, desfazendo-se rapidamente no ar e tomando a forma leve de uma bola de energia tão escura quanto a noite. E do alto matagal que crescia ao redor do asfalto, outra figura surgiu.
Um grande gavião invadiu o cenário, seguindo os passos do primeiro animal e se transformando em uma gélida aura negra tão assustadora quanto a primeira.
Os encarnados que seguiam em nossa direção afrouxaram o passo, alguns chegaram a cessar a própria corrida, encarando ceticamente o que acontecia a sua frente. Senti um desconforto gigantesco nascendo de alguém em meio àquele grupo, mas os outros se mantinham realmente firmes.
— Soltem os animais! — Ordenou a mesma mulher de antes, e então um conjunto de doze ou treze auras, contendo cores diferenciadas umas das outras, preencheram pouca parte do céu que conseguíamos ver dali. — Acabem com essas moscas!
As luzes coloridas pareceram eclodir de ansiedade, avançando tão apressadamente quanto as pessoas, que agora voltaram a correr feito desesperados pelo asfalto resfriado pela noite urbana.
— Não podemos lutar contra tantos...
— Podemos! — Decidi, interrompendo-o deselegantemente. — São simples novatos...
— Eu sou um simples novato! —Lembrou.
— Mas você foi escolhido pelo chefe, então não deve ser de todo ruim. De qualquer forma, precisamos fazer alguma coisa antes que eles entrem na cidade.
— Eles vão entrar na cidade, Marianne, e nós vamos ser massacrados!
— Não vão! — Retrucou alguém, tirando-me a chance de gritar com o aprendiz depressivo. — Sairrus, já sabe o que fazer!
Por um momento, pensei ter ficado completamente cega enquanto uma luz extremamente forte e de um branco tão puro quanto Celly preencheu a grande noite, mas logo pude ver um brilhante globo de luz flutuando pela estrada, passando rapidamente ao meu lado e indo em direção aos demais encarnados.
Levantei-me e dei meia volta, dando de cara com um homem musculoso de expressão dura dominando os olhos escuros. Usava roupas de marca — embora estivessem rasgadas em certos pontos — e mantinha um par de facas de lâminas desgastadas preso nas laterais de seu cinto de couro, junto a uma corda e algo que parecia um sinalizador.
— Peter, espere! — Soltou outra voz enquanto seu portador deixava o alto matagal para se juntar ao seu amigo de aura branca. É claro que eu reconheci aquela voz, e o irritante sotaque espanhol foi o que me ajudou a perceber quem era.
— Corbin... — Disse. Na verdade eu apenas havia pensado alto, mas isso fez o rapaz olhar para mim, de qualquer forma.
— Marianne? — Bufou. — Eu já deveria saber... Quem mais perderia a noite em uma estrada vazia fora da cidade?
— Vocês se conhecem? — Perguntou Matt assim que desistiu de observar a aura branca partindo os encarnados azarados ao meio. — Ele está do nosso lado?
— Digamos que ele não gosta tanto assim de nós... — Respondi, cruzando os braços enquanto meus ouvidos captavam cada grito de desespero vindo da pequena batalha próxima a este pequeno grupo.
— Não me interessa o histórico de nenhum de vocês. — Revelou o dono da aura branca. — Boston passará por dias estressantes enquanto o demônio da ilusão estiver atuando. Até tudo se resolver, nunca teremos plena certeza se estamos mesmo em nossa realidade. Em outras palavras, a motivação pessoal que alguém tenha para odiar o outro não é válida enquanto tudo não volta ao seu normal.
— Certamente... — Concordei, dando as costas aos dois indivíduos e me voltando para o grupo de revoltados — que agora se resumiam a três pessoas e duas auras — enquanto Burnstein e Thross retornavam à suas formas animais. Eu não os culpava, estava claro que aquele globo de luz não necessitava da ajuda de outros. — Parece-me que treinou bem o seu ajudante, Peter...
— Apenas o especializei em batalhas, Marianne, mas devo admitir que seria trágico se ele tivesse que se esconder... É como você e seu gato espião, que aparentemente não sabe nada sobre lutas.
— Escute, você não tinha uma espécie de parceiro? — Perguntou Corbin enquanto pegava seu revolver e o limpava com um pano sujo que havia tirado do bolso de trás de sua calça. — Digo, outro parceiro...
Esbocei um sorriso leve no rosto enquanto esperava Matt desfazer a expressão confusa que até agora fazia, e então cruzei os braços antes de responder ao espanhol, em uma voz calma.
— Os planos de Paul não mais se encaixavam em minha agenda... — Revelei. — Como sempre, o menino se deixou levar pelos sentimentos. É claro que passar as tardes com um bando de jovens adultos prestes a morrer deve ser mais interessante que uma vida como a qual têm levado. O pobrezinho ainda carrega esperanças, pelo amor de Deus... — Respondi, percebendo que o grande tigre havia voltado aos pés de seu dono, deitando no asfalto frio como se a temperatura local não o afetasse de forma alguma. — E vocês, o que fazem aqui?
— Bom... — Começou a dizer Peter, também de braços cruzados. — Certamente não contaríamos nossos planos ao inimigo, mas digamos que temos aqui o mesmo objetivo...
— Não entendi...
— Recebemos ordens para manter os demais encarnados longe da cidade até que o segundo demônio fosse detido. — Respondeu-me.
— O segundo demônio...
— Sim. — Disse, interrompendo-me sem pena. — e o seu alvo agora é um dos comunicadores. Tie Hitchester.

(Continua...)

Lua Escura - Parte 8

Um encarnado recebe sua missão assim que deixa de pertencer ao mundo dos humanos. Caso a cumpra, a liberdade será seu prêmio. Caso fracasse... Bem, só posso dizer que eu sempre vou me arrepender por ter me aproximado tanto assim daquele grupo de amigos...
Eu pagaria caro pelo modo como deixei meus sentimentos conduzirem meu corpo, e pagaria mais caro ainda por simplesmente ter me apaixonado.
A típica história dos contos atuais: Uma paixão proibida, uma missão impossível e uma guerra espiritual... Parece que a má sorte voltou a me encontrar...

----------- Paul:

— May! — Gritei, apontando com o nariz para o garoto parado a sua frente. — O que houve?
— Eu não sei! — Respondeu, ajoelhando-se ao lado de seu amigo que parecia ter congelado o cérebro em menos de um segundo.
Era aterrorizante. Tie estava ajoelhado, olhando fixo para o local onde May havia caído após o ataque de sua maldosa prima. Era como se uma camada invisível de gelo o tivesse dominado, impossibilitando-o de fazer qualquer tipo de movimento por vontade própria.
Seus olhos nada expressavam, e sua mão direita continuava esticada para o vento, como se ainda estivesse tocando a pele gélida de sua amiga. Era como se Tie não tivesse mais controle nenhum sob sua mente, e não lutasse para tê-lo de volta.
— Ele está em transe! — Rosnou Amy, assustando tanto May quanto eu mesmo que, por um momento, havia esquecido quase que totalmente de sua existência. — Ele voltará a si qualquer hora. Agora me devolva o diário!
— Cale-se, Amy! — Gritou May, ainda sacudindo Tie pelos ombros. — Mas que droga... O que está havendo com você...
— O demônio da ilusão... — Lembrei. Fora exatamente pelo que eu havia passado tantos anos atrás. Havia sido encurralado em minha própria mente, e não havia nada que eu pudesse ter feito para me livrar daquilo. — May, é isso! O demônio está tentando confundir Tie!
Encarei a garota por alguns segundos, esperando seu cérebro absorver por completo a minha teoria. Assim que o fez o rosto da bruxa se modificou a uma expressão desesperada e um tanto assustadora. Ela voltou seus olhos preocupados para mim e eu pude jurar sentir seu coração acelerado apressando cada vez mais o seu trabalho.
— Paul, ele só está em choque, ele... —Quebrava ela enquanto Owllie encarava tristemente os olhos congelados de seu dono. — Deve haver algum feitiço, alguma maneira... Me leve até ele!
— May, eu sei como se sente, mas os ataques deste demônio são inteiramente discretos e inesperados. O que está havendo com Tie pode, sim, ser a mesma coisa que houve comigo anos atrás!
— Na verdade, o demônio das ilusões possui uma grande fraqueza... — Revelou Amy, fazendo com que ambos na sala olhássemos interessados para ela. Mesmo assumindo o fato de que era uma garota não muito confiável, não há nada errado em apenas escutar. Além do mais, se ela estiver enganada ou mentindo, não mudará em nada nossas vidas. — Existe um meio de trazer o inconveniente de volta antes que ele tenha de passar por todo o sofrimento que o “monstro” proporciona em seus pesadelos.
— Do que... Do que está falando? — May se levantava lentamente, parecendo atenta a qualquer coisa.
— Está mentindo! — Acusou uma terceira voz, aparentemente vinda de lugar nenhum, até eu reparar uma linda mulher de vestido de seda branco decorado com alguns fios que se enroscavam em um brilhante rosa claro no local da barriga. A moça descia as escadas com tanta delicadeza que pensei ser uma professora de etiqueta. — Francamente, pequena Amy, existem formas mais honestas de derrotar seus adversários.
Celly parou diante de May, de costas para a mesma, encarando a versão maligna da garota com detectável desgosto.
— Não venha me falar de honestidade. — Retrucou Amy. — O grupo de escolhidos já se formou há algum tempo, Celly... E, no entanto, parece-me que os mesmos ainda te veem como uma pura anja da guarda. Não contou a verdade à minha prima, não foi?
May me encarou por um segundo, como se estivesse me perguntando algo. Fiz que não sabia com a cabeça e voltei minha atenção ao desenrolar da cena a minha frente.
Afinal, Amy e Celly se conheciam? Celly estava mentindo? Talvez sim... Quero dizer, ela é mesmo um pouco reservada demais para uma anja, mas nos salvou muitas vezes.
— Eu... Não faço ideia do que sua boca imunda esteja dizendo! — Respondeu a protetora. E, mesmo com sua autoridade celestial, pude notar um pingo de tensão em sua fala.
— Não mesmo? — Duvidou Amy, cruzando os braços e sorrindo maldosamente. — Talvez precise que eu refresque sua memória.
— Talvez precise que eu roube a sua! — Devolveu imediatamente Celly, demonstrando impaciência. — Talvez eu o faça, para que nunca mais volte a falar com um divino nesse tom!
— Vocês duas querem calar a boca? —Sugeriu May, ainda com os olhos fixos em seu amigo paralisado. O curioso era que ela não desviava seu olhar dele enquanto falava em momento algum, como se temesse ter de correr atrás de um corpo fugitivo. — Tie está com um enorme problema agora e o máximo que as damas conseguem fazer é discutir por algo que eu nem me dei ao trabalho de prestar atenção?
— Sinto muito May... — Disse a anja enquanto se virava para os dois amigos, deixando Amy encarar suas costas por um tempo. — Nada poderemos fazer para ajuda-lo. Quando o demônio da ilusão se instala na mente de alguém, ele recria todo um mundo imaginário exatamente igual ao nosso. Para escapar, Tie deverá perceber que não está no mundo real.
— E como é possível que ele perceba isso?
— Este é um demônio forte, May, mas não invencível. Ele sempre se esquece de copiar alguma coisa ou montar perfeitamente alguma personalidade. Acredite em minhas palavras: Sempre há um defeito escondido em uma ou duas pilastras!
— Eu preciso entrar na mente dele! — Insistiu May. — É um anjo, deve saber de um jeito!
— May, você...
— Eu sou a culpada por tudo isso estar acontecendo! — Disse, impedindo Celly de responder a última frase. — Paula diz isso, Jennifer diz isso... Inna diz isso o tempo todo! E eu sei que ambas tem razão em suas acusações!
— Preciso ir! — Afirmou a anja, ignorando totalmente as reclamações da bruxa escolhida. — Sugiro que fiquem de olho no garoto. Cada tremor, ataque, mesmo que esteja apenas com febre, pode ser um sinal de que Tie não está aguentando. Apenas... Observem...
Uma luz esbranquiçada tomou conta do cômodo por alguns segundos, recolhendo-se em um globo de luz que logo se tornou invisível a olhos humanos. Alguns trovões pareceram gritar furiosos com o céu noturno, e então percebi que Owllie continuava a frente de seu dono, esfregando-se nele como se Tie pudesse sentir. Mas ele não podia.
Permanecemos parados por quase cinco segundos, ambos demorando tempo demais para reagir à fuga do ser angelical que antes aqui presente estava. A escuridão sufocante retornou ao lar, juntando-se à nos e ao cheiro de sangue que dominava o ambiente e me provocava certo enjoo vez ou outra.
— Eu lhe entrego o diário.. — Afirmou May, encarando o chão e matando o silêncio desconfortável que se formara ali.
— O que? — Dissemos eu e Amy em uníssono.
— Mostre-me um jeito de salvar Tie... — Pediu, sem subir o olhar nem mesmo um centímetro. — Leve-me à mente dele, e eu abro mão da herança de minha avó...
— May, o que você...
— Paul, essa gente já sofreu demais por minha causa. — Respondeu, antes mesmo de eu conseguir completar a pergunta. — Enfrentaram sombras, possuídos, materializados... Tudo por minha causa. Todos eles, até mesmo Heath...
— Heath sofreu por minha causa! Eu o transformei!
— Para que pudesse vir atrás de Paula, lembra-se? — Recordou. — E fez com que ele a transformasse para que ambos pudessem chegar até mim.
— Nem tudo é sobre você...
— Não, mas isto sim! — Gritou, tentando por um fim a nossa discussão antes que mais alguém precisasse ser salvo. — Até agora, tudo tem sido culpa minha, Paul! Riley foi possuído, Jennifer sequestrada, Tie ficou preso em um mundo inexistente e agora isto está se repetindo!
— Não May, você é apenas mais um peão em meio a um gigantesco tabuleiro de cristal! — Dessa vez foi Amy quem tentou convence-la, o que me provocou um leve arrepio de dúvida. — Será que não entende? Tie e os outros possuem tanta culpa nisso quanto você. Eu também, e Paul, e qualquer um que faça parte disso! É o nosso mundo, sua idiota, mas isso não quer dizer que fomos nós que o causamos! Somos as vítimas... E você, May, é a maior delas...
— Eu não... — Gaguejou a garota, parecendo ter perdido todas as palavras de seu vocabulário. Era como se ela houvesse tomado conta de um pingo de vergonha que agora crescera exageradamente, misturando-se com as faíscas de culpa que seus olhos exalavam. — Não me importo... A culpa pode não ser de toda minha, mas isso não resolve absolutamente nada... Leve-me a mente dele!
— Sinto muito. Por mais que eu deseje tomar posse deste caderno, não existem meios de se conectar a mente de alguém a menos que ambos sejam divinos de raça pura ou mensageiros...
May soltou um suspiro, mas não pude identificar o que aquilo significava.
— Isso quer dizer que sou inteiramente inútil... — Reclamou a bruxa. — Bem, precisamos de um pla...
— May! — rosnei, interrompendo-a com o propósito de chamar sua atenção para o que realmente parecia preocupante no momento. — Tie!
Esperei ambas as garotas voltarem seus devidos olhares para o ser congelado que decorava o canto do cômodo. Owllie continuava tentando despertar o seu dono, mas algo mais perturbava o ambiente agora.
— O que é...
Tie agora estava deitado, praticamente colado ao chão, tremendo como um bebê sem roupas em um dia de inverno. Suas mãos se movimentavam um pouco, parecendo querer segurar algo fora de seu alcance, e pude perceber, com minha visão avançada, que o suor dominava seu rosto.
— Isso não pode ser algo bom... — Palpitei.

(Continua...)

Lua escura - Parte 7

A vida não se torna mais fácil quando o segredo do além lhe é revelado. A verdade é que não existe segredo nenhum... O problema são nossos olhos simplificadores que não aceitam o que veem.
Quando olhamos ao redor percebemos o caos que nós mesmos manipulamos sem ao menos pensar em como nossos espíritos reagem a isso. Pior, como os outros espíritos reagem.
As guerras não só destroem o planeta, como afeta todas as camadas que nos cercam. Apenas não acho certo que nós, adolescentes “indefesos”, pagarmos pelo que vocês provocam.
A propósito, muito obrigado pela ignorância de cada ser humano!

---------- Tie:
— Owllie! — Gritei, esperando minha coruja levantar voo e atacar novamente a garota que tentara matar May.
E foi o que ele fez! Owllie deu uma volta completa em toda a sala e, por fim, se transformou em um globo de luz azul cercado por uma fumaça de mesma cor. A aura avançou na bruxa, que parecia esperar pacientemente até que o choque ocorresse... Até que:
— Sintieniel Protecs! — Rosnou, um segundo antes de uma espécie estranha de barreira roxa/transparente crescer ao redor de todo o seu corpo.
Owllie se chocou contra a barreira, que pareceu se mover como água quando uma gota cai sobre ela, sendo arremessado até o lado oposto da sala, onde atingiu outros azulejos beges, rachando-os no mesmo instante. Sua forma animal retornou a ele antes de cair inconsciente no chão.
— Owllie! — Gritei outra vez, agora com espanto e raiva em minha voz. — Maldita!
Queria revidar o ataque, mas eu não tinha os poderes de May e ainda não havia dominado totalmente meu controle mental (nem mesmo sabia se isso servia como ataque ou apenas como meio de comunicação). Tudo o que pude fazer foi correr até meu animal e o pegar nos braços.
— Essa guerra é minha, garoto... — Avisou-me Amy, antes de sua raposa se levantar e mancar até os pés de sua dona. — Seria melhor deixar que eu acabe sozinha com essa vadia e poupe a vida de sua ave. Saia daqui!
— Essa guerra é nossa, bruxa! — Revidei, voltando a estar ao lado de May. — Você nem faz parte da nova geração, não entendo por que insiste em se meter nisso! O que você quer?
— O DIÁRIO DE MINHA AVÓ! — Por um momento, tive a impressão de que a voz da garota havia engrossado brutalmente. Talvez seja só coisa de minha cabeça.
— O diário é de minha avó! — Respondeu May, com os dentes trincando. — Ela me deu ordens diretas para não lhe entregar! E não o farei isso! Siésquerros!
— Revidy Nolae! —Gritou Amy, apontando para mim.
Observei uma faísca vermelha sair das mãos de May e rebater nas de Amy, vindo diretamente em minha direção. Não tive tempo para pensar: Joguei Owllie em cima da mesa de mármore e aguardei até ser arremessado.
Não demorou muito. Fui lançado pelo ar até a parede atrás de mim, onde o choque fez com que um grito sufocado escapasse de minha garganta. Caí em cima dos restos de azulejo que May havia quebrado quando fora atingida pelo mesmo feitiço, o que provocou dois cortes dolorosos em minha barriga.
— TIE! — Berrou minha amiga, segurando um de meus braços para me ajudar a levantar. Assim que consegui me manter em pé (claro que minha barriga, minhas pernas e meu pescoço estavam cortados e ensanguentados ao extremo), a garota virou-se para sua versão maligna e gritou. — Ptonwon Auryollu!
Uma forte luz de tom avermelhado invadiu a cena, lançando ondas invisíveis de ar para todas as direções. O que antes era uma sala abafada, agora parecia uma leve amostra grátis do polo norte. A luz enfim se concentrou em um pequeno globo de luz vermelho, que era perseguido e envolto por uma espessa fumaça de mesmo tom e parecia flutuar a muitos centímetros de distância do chão, de modo que ficava a altura de nossos ombros.
Percebi como aquele globo me trazia depressivas lembranças do dia em que o pequeno Owllie entrou em minha vida. (Embora minha aura tenha adquirido a coloração azul, ainda assim as lembranças atingiam seguidamente meu peito.).
— Como você... — Amy quebrou sua frase, incapacitada de pensar. May também estava chocada, aparentemente o feitiço havia saltado de sua boca. Ela não havia feito absolutamente nada...
O globo de luz continuou lançando suas ondas gélidas de ar, até descer e tocar o chão. Nesse instante, a luz avermelhada se intensificou de tal modo que tive de manter meus olhos fechados. Assim que os abri, um pequeno animal (um pouco maior que meu bebê coruja) havia tomado o lugar do globo de frio.
Assim que os últimos vestígios da mágica luz resolveram se recolher, pude perceber que um filhote de coala (Sim, ele tinha pelos por todo o corpo) de uma pelagem cinza com suas pontas extremamente brancas e olhos negros e carentes havia tomado o lugar do globo.
— Minha nossa... É o meu... É... — Minha amiga se ajoelhou e estendeu os braços para o coala. O animal se segurou em seus dois dedos polegares — Agarrando um deles como cada mãozinha — e escalou os braços delicados e cortados de May até se encolher num abraço. — Minha aura!
Pensei em como um animal como aqueles reagiria em batalha, mas não se pode duvidar de nada quando se trata de auras. Eu que o diga, Owllie já salvara minha inútil vida incontáveis vezes desde que saímos daquele maldito universo paralelo.
— Como você conseguiu isso? — Gritou Amy, trincando os dentes ao mesmo tempo em que cerrava os punhos. — Não pode... Isso é impossível! Os feitiços não entram simplesmente em seu cérebro... Você precisa treinar para dominá-los.
Eu e May nos encaramos quase que de imediato, confusos. May havia lançado pelo menos dois feitiços diferentes hoje. Isso sem contar o que havia acontecido nesta tarde, quando a garota me salvou dos feitiços de sua prima maldosa. E, no entanto, May não havia treinado uma única vez em toda a sua vida.
— Eu não quero saber! — Disse, lembrando-me angustiadamente das palavras que May dizia há Paul alguns minutos antes. (Sim, meu controle mental havia evoluído a tal ponto que eu agora podia escutar os sussurros alheios.). — Por que não volta para o seu treino e nos deixa em paz?
— Por quê? — Perguntou-me, o que quase me fez soltar uma resposta. Amy foi mais rápida. — Por que você insiste em se meter nos problemas de nossa família? Por acaso precisa que eu lhe ensine uma lição?
— Ouse tocar um dedo em Tie! — Rosnou May, o que realmente me assustou. — Ouse fazer isso e você brevemente arderá no fogo mais sombrio e caótico do inferno!
— Mande-me para o inferno e nunca mais veja Paul... — Retrucou, com um sorriso besta no rosto. — Ou seu pai!
Mesmo não conhecendo muito o pai de May, — Ele me assustava, admito. Parecia não gostar muito de mim, ou então fazia de propósito para que eu não tivesse muita intimidade. — Senti como se algo perfurasse minha barriga. O frio se intensificara, e o ambiente ficou tão tenso que meu estômago se revirou mais de uma vez.
— Meu pai está viajando! — Gritou May, respirando ofegantemente com uma terrível ira a dominando.
— Nas profundezas, querida. — Respondeu a bruxa. — Ele está viajando nas profundezas inexploradas e desconhecidas dos túneis de éden!
Túneis do éden?
— Está blefando! — Respondi, o que fez a raposa rosnar para mim.
— É claro que está! — Assentiu May, cerrando os punhos.
— Se me matar, nunca vai saber a verdade... — Disse, desfazendo a barreira roxa à sua volta. — Mate-me, e nunca mais veja Paul ou seu pai...
— O que me garante que...
— Pensando melhor... — Interrompeu Amy. — Mate-me, e nunca mais veja Tie também!
Meu corpo endureceu como uma rocha em uma fração de segundos. O frio agora dominava meus pulmões, e meu coração parecia querer fugir de mim, batendo tão rápido que percebi o que eu sentia: Medo!
— Crolluscus Sinimega!
— TIE, NÃO! LARGUE-O! — May se ajoelhou ao meu lado, pondo o coala no chão e tentando quebrar algo que agora me impedia de mover os pés.
Um grande casulo de pedras subia por todo o meu corpo, vindo diretamente do chão e crescendo mais e mais a cada segundo. As pedras logo chegaram à minha cintura, prendendo parte de meus braços logo depois.
May chorava sem impedir suas lágrimas, tentando sem sucesso impedir as rochas de me acolherem.
— May... — Chamei, observando enquanto ela voltava seus olhos encharcados para mim. — Vou ficar bem... — Prometi, mesmo que não soubesse se era mesmo a verdade. — Vou esperar você ao lado de Paul...
— Como sabe que vou conseguir te salvar? — Perguntou, entre soluços e mais algumas tentativas de impedir o casulo, que agora se aproximava de meus ombros.
— Eu sei que vai... Você sempre consegue!
Foi nesse instante que Owllie despertou, tão desnorteada que mal havia notado o que estava acontecendo comigo. Era como se não enxergasse minha má sorte.
— Proteja-a para mim, okay? — Pedi, observando a jovem garota assentir com a cabeça. — E se proteja... De tudo. Pode prometer que ficará bem?
— Tie... Eu prom...
O casulo se fechou acima de minha cabeça nesse exato momento, impedindo-me de escutar o fim da frase. Estava quente e úmido, e eu sentia “coisas” pegajosas se moverem ao meu redor. Era como se eu estivesse explorando uma caverna estreita a ponto de caber só um morcego.
Inexplicavelmente pude sentir as mãos de minha amiga tocarem o casulo pelo lado de fora. Repreendi as lágrimas que tentavam escapar. O que aconteceria agora? Nunca mais veria May? Nunca mais veria ninguém?
Por todo esse tempo fingi estar bem, mas minhas lágrimas sempre caíam quando eu voltava para casa toda noite. Elas chegaram mais cedo hoje, e eu cansei de prendê-las. Não fazia sentido... Não havia ninguém para ver.
Não pode me deixar aqui, Tie... Por favor...
Sabia que May sofria do outro lado, o que me apavorou mais ainda. Eu nada conseguia ver, e nada conseguia ouvir. O que Amy estaria fazendo a ela?
Mais uma vez, eu era apenas o fracassado do grupo. Aquele que sempre deixava todos na mão bem na hora que mais precisavam. Foi assim com Inna, quando estava desmaiada na grande mansão; Foi assim com Paul, quando o maldito materializado se jogou em cima dele; Foi assim com Jeniffer, quando ela estava presa naquela cama-rocha de Marianne e eu mal conseguia me mover. E agora seria assim com May...
Não deixe ela te intimidar... Disse, encostando-me às rochas úmidas que me cercavam. Você é bem melhor do que ela, sabe disso. Estarei esperando você com seu pai... E Paul...
Tie...
Não dê o diário a ela, May. Você precisa sobreviver!

Ouvi um estrondo correr por todo o ambiente externo ao casulo, e então senti o chão se abrir aos meus pés (aos pés do casulo, na verdade. Isso se ele tivesse pés.) e então senti a pressão e a gravidade me absorvendo.
Tudo acabava aqui, então? Eu tentava confortar May, dizendo que a encontraria depois. Mas a verdade era que eu não sabia se haveria um depois.
E se eu não estivesse indo a lugar nenhum? E se Paul já estivesse morto e eu estivesse indo pelo mesmo caminho?
Pare, Tie, por favor. Eu consigo ouvir seus pensamentos...
Boa sorte...
Por favor, Tie, prometa que voltará.
Não posso...

E foi ai que o ela mental se desfez... Agora eu não estava mais no mundo mortal.

(Continua...)

Lua escura - Parte 6

Uma luz simboliza uma vida. Quando alguma luz se apaga, em qualquer lugar do mundo, alguém segura a mão de um anjo pela primeira vez. E, quando uma se acende, um novo sorriso está prestes a viver.
Mil sombras não valem tanto quanto uma única luz, mas nenhuma luz sobrevive sem ser sustentada por uma sombra. É como a dor... Sabemos que estamos bem apenas no momento em que paramos de senti-la. Sabemos ter algo valioso assim que ele se quebra com um doloroso estalo. O mundo funciona assim...
O nosso mundo, devo dizer...
O mundo das almas frias e ingratas, que apenas dão valor as coisas quando percebem tê-las perdido para sempre...
Aqui estamos nós, falando diretamente do cemitério dos mercenários...

----------- May:

Tive de manter meus olhos completamente fechados por pelo menos quatro segundos inteiros, voltando a abri-los apenas no momento em que a estranha luz gerada por Celly parou de me fornecer seu sonolento calor. Eu disse sonolento, não entediante.
Uma leve brisa agora roçava meu rosto e partes do meu corpo. Não era muito forte, mas fazia com que diversas pétalas flutuassem sem pressa ao nosso redor, juntas a alguns feixes de luz dourados que atravessavam as nuvens fofas e brancas e caíam do céu acima de nós. Aos meus pés, que agora estavam descalços, cócegas fracas eram provocadas por um lindo gramado verde e vivo que destacava girassóis aqui e ali.
Havia violetas coloridas ao redor de todo o cenário, misturadas com dezenas e mais dezenas de tulipas e rosas. Um pouco mais atrás, incontáveis fileiras de pinheiros e coqueiros isolavam tal lugar de qualquer perigo, mas abriam espaço para a dança das muitas borboletas que rodeavam o local.
— Este lugar é... Estamos no... Com luzes e... O ar é tão... Grama verde... — Quebrava Tie, tentando formular alguma frase. Assim como eu, ele parecia estar sem palavras. Na verdade, quase parecia sem ar. — Quero dizer... Estamos no...
— Ei... — Sussurrou Inna, e só então percebi que suas vestes pretas haviam sido substituídas por um lindo vestido longo e branco, e seu cabelo estava em um negro intenso e parecia ter passado por um alisamento profissional. — Eu Me lembro desse lugar! Esse é o... O templo!
— Sim, minha pequena pomba branca. — Concordou Celly, voltando a nos encarar meio segundo depois. — Gostaria de poder explicar tudo a vocês, mas mal temos tempo aqui... Na verdade, anjos, o tempo está se esgotando em qualquer lugar.
Encarei Celly por dois longos segundos, percebendo que seus olhos eram guardados por uma teimosa camada de gelo que, crescendo mais a cada segundo, cercava as sobras do aconchegante fogo de sua aura.
— Por que nos trouxe aqui, Celly? — Perguntou Tie, finalmente recuperando o ar. Sua expressão agora endurecera um pouco, quase como se estivesse com raiva de algo, mas não quisesse nos contar por algum motivo. — E por que motivo Mickaella não pode vir conosco?
— Não me entendam mal, — Pediu a anja. — mas a jovem Micka representa a parte terrena de vocês. Sendo assim, ela nunca pode vir aqui antes de sua verdadeira hora, a não ser que não pretenda voltar...
— Tudo bem, isso responde as coisas por enquanto... — Respondeu o garoto, ainda nervoso com alguma coisa.
— E o que fazemos aqui? — Inna disse, se abaixando para pegar uma rosa branca que estava em seus pés.
— O mundo que vocês conhecem está passando por uma lavagem cerebral. — Revelou, se aproximando alguns passos de nós. — Eu precisava que vocês se lembrassem de tudo. De tudo o que eu vou dizer agora! Prestem atenção, é importante...
Não pude deixar de notar que Tie recuou à medida que nossa amiga avançou. Era quase como se ele tivesse medo dela e não quisesse tocá-la de forma alguma.
— Tem um novo demônio solto. — Disse, fazendo instantaneamente todos olharem para ela ao mesmo tempo, com a mesma cara de espanto. — E parece que a ordem do inferno foi alterada, pois quem veio a terra foi o terceiro demônio: O demônio da ilusão.
— é claro! — Gritei, assustando os outros. — Paul disse uma vez que existiam cinco demônios diferentes: O morcego das sombras, a raposa do fogo, o homem da ilusão, o quarto que foi preso no inferno, e a serpente de éden.
— Onde eu estava quando ele disse isso tudo? — Perguntou-me Inna, cruzando os braços como se eu fosse culpada por algo.
— Estava com a dama das aranhas, lembra? Desmaiada...
— Cada demônio está ligado a um membro de cada geração, — Começou a explicar. — e só este deve detê-lo. O grande morcego estava ligado à Riley, e conseguiu fugir pelo fato de o garoto não o ter enfrentado realmente. A grande fraqueza dos demônios e a insistência humana, algo que Riley não tem.
— Espere! — Inna protestou, talvez para assimilar tudo calmamente. O que eu entenderia, pois era informação demais para só um dia. — Se cada pessoa do grupo tem de derrotar um demônio, então o demônio da ilusão está ligado a quem?
Ela respirou um pouco antes de responder, encarando todos nós, um de cada vez, como se fossemos ficar chocados com a ideia. Pousando os olhos em mim, o que realmente me congelou, ela finalmente disse:
— Tie Hitchester...

Fomos transportados para casa dez minutos depois.
Como Celly havia prometido, todos os sinais de batalha em Boston haviam desaparecido. Calçadas inteiras e no lugar, nada pegando fogo, pessoas se recolhendo para suas casas com crianças elétricas por causa dos doces. Apenas as decorações pareciam rasgadas e sujas, mas ninguém parecera perceber isso.
Inna correu para casa assim que voltamos, e Tie ainda passou um tempo ao meu lado. Talvez ele não quisesse ficar sozinho depois do que acabara de ouvir, o que eu entendia perfeitamente. Ou talvez ele estivesse apenas esperando que eu lhe fizesse algum feitiço útil de proteção, o que não aconteceu. Quase tive pena dele, mas o garoto se despediu e voltou para casa algum tempo depois.
— Então... Celly não queria que se esquecessem da noite? — Perguntou Paul, que havia ficado mais um pouco comigo para me ajudar a recolher e guardar os únicos restos de decoração que eu havia arrumado sem ânimo antes de tudo isso. — Isso não é uma atitude muito comum nela...
— Celly também disse sobre um novo demônio... O demônio da ilusão... — Confessei, encarando o chão por um tempo enquanto me apoiava no mármore da mesa da sala de jantar. — Paul... Acha que Tie consegue? Digo... Ele é o mais próximo de um irmão que eu consigo ter, e já perdi gente demais da família.
O rapaz me encarou com seus olhos azuis, agora frios, e se aproximou com seus passos lentos de mim. Mal percebi quando ele pegou uma de minhas mãos e a beijou, mas o ato me provocou um arrepio assustador.
— Não se preocupe com Tie... — Disse. — Ele ficará bem, May. Todos ficam... Eu fiquei.
— Você o que? — Perguntei, ainda encarando o mármore.
— O demônio da ilusão se ligou a mim da última vez. — Revelou, embora suas palavras agora parecessem um sussurro. — O mandei para o inferno outra vez... E sei que Tie fará o mesmo.
Não prestei mais atenção ao que o garoto dizia a partir do momento em que sua outra mão tornou a acariciar meu cabelo. Estava mais atenta às intenções dele do que em suas palavras.
Finalmente ele largou minha mão, pondo a sua em minha cintura e me fazendo girar em cento e oitenta graus, até que estivéssemos cara a cara.
— O que está fazendo Paul? — Perguntei, no exato momento em que nossos olhos se encontraram e suas mãos passaram a sustentar meu rosto.
Mas não obtive resposta, o que me deixou ainda mais nervosa.
— Ainda precisamos falar de Tie? — Perguntou, se aproximando tanto de mim que passei a sentir seu hálito. Uma mistura doce de menta e carência invadiu meus pulmões. — Ainda precisamos falar de alguma coisa?
Eu estava ficando sem ar, não sabia o que fazer.
Não estava com frio, estava longe disso, mas precisava mortalmente de seus braços me aquecendo. Percebi isso, e ele também notou meu desejo.
Senti outro arrepio no momento em que ele me abraçou sem tirar os olhos de mim. Apenas nossos rostos não se tocavam naquele momento, mas isso não foi problema por muito tempo.
Nossos lábios finalmente se roçaram, tocando-se definitivamente um segundo depois. Ele pôs a mão direita de volta em minha nuca enquanto nossas línguas se encontravam, e então meu corpo todo passou a responder com uma gigantesca dormência.
Ele se afastou para me encarar, mas eu segurei em sua camisa e o puxei de volta, o que me surpreendeu. Eu não queria mesmo que aquele momento terminasse. Eu precisava daquilo, de tudo.
Voltamos a nos beijar junto ao nascimento de um arrepio, o que me fez suspirar entre um beijo e outro. Segurei firme seu rosto, e suas mãos seguravam minha cintura. Não era necessário, pensei, pois eu não fugiria daquilo, mas eu gostava de como suas mãos me aqueciam. E isso também me dava prazer.
Por um momento, finalmente, esqueci-me de tudo ao meu redor. Minha vida havia desaparecido milagrosamente. Auras, espíritos, maldições, guerras... Nada mais fazia parte de mim. Até os amigos eram apenas uma vaga lembrança de um mundo imaginário.
Ainda me segurando pela cintura, ele me levantou e me fez sentar em cima da mesa de mármore. Colamo-nos novamente, sem interromper o beijo em nenhum momento. Eu me arrepiava de dois em dois segundos, e Paul parecia perceber e gostar disso.
— Isso é errado... — Sussurrou em meu ouvido, o que me fez apertar seu braço de ansiedade e nervosismo.
— Não quero saber... — Respondi, trincando os dentes. Sem abrir os olhos em nenhum momento. — Apenas me beije...
— É sério, não pensei em meus atos... Não consigo parar depois que começo, e não farei força para me impedir...
— Então não pare! — Revidei, mas minha voz quase que soava desesperada. — Faça o que quiser...
— Com muito prazer! — Gritou uma terceira voz. — Siésquerros!
Apenas percebi a maldita presença de minha prima no momento em que fui arremessada contra a parede à direita. Voei de cima da mesa, literalmente, chocando-me contra os azulejos beges da sala e caindo no chão um segundo depois.
Tentei me levantar duas vezes, conseguindo apenas na última. Estava sentindo muitas dores, e um corte de seis centímetros havia nascido em minha barriga. Pior do que o sangue que escorria por ali era a forte ardência que aquilo me provocava.
— Amy! — Grunhi. Tentei me lembrar de um feitiço que havia lido no diário na noite anterior. Era algo como... Crosswon... Tronwon... Não, era diferente... Era bem diferente... Era... — Ptonwon Levius!
Minha voz ecoou em todo o local, e uma luz vermelha enfumaçada em forma de um lobo alpino avançou na outra bruxa e a fez cair de costas no chão. O lobo ergueu suas garras ao ar a as arrastou pelo rosto da menina.
Meu amigo desapareceu logo depois, mas agora eu tinha dois cortes de vantagem (Visto que agora ela tinha três no lado direito de seu rosto.).
— Uma bruxa com aura ainda bloqueada e com um defensor que apenas sabe arranhar... — Ela sorriu, batendo palmas. — Minha vez, priminha! Ptonwon Levius!
A luz roxa surgiu aos pés da minha inimiga. O pastor belga avançou tão rápido contra mim que mal tive tempo de impedir que ele mordesse meu braço duas vezes, em dois lugares diferentes.
Obviamente, comprovando como eu não era nada parecida com Inna, soltei um agonizante grito e deixei que minhas lágrimas caíssem livremente, uma atrás da outra.
— May! — Gritou Paul, correndo em minha direção.
— Crolluscus Sinimega! — Rosnou, apontando com o indicador para o rapaz loiro.
Um grande círculo de rochas cresceu direto do solo, atravessando e quebrando o piso, se enroscando em Paul e o prendendo, como uma borboleta em um casulo.
— Crolluscus Nometerra! — Continuou, e então o casulo voltou ao solo, fazendo Paul desaparecer diante de meus olhos.
— Maldita, deixe-o fora disso! — Gritei, ainda com o braço e a barriga ensanguentados. — Siésquerros! — Não sabia o que estava fazendo, mas já escutara tal feitiço duas vezes.
Pensei em atingir a garota, mas sua raposa levitou em vez disso, sendo arremessada contra a parede e jogada brutalmente no chão depois. Sim, eu iria me arrepender disso. A culpa de Amy ser uma idiota medíocre não era da pobre raposa!
— Vai se arrepender! — Ela gritou, apontando os dois braços para mim. — Croll...
—Ainda não, vadia! — Gritou alguém, um menino, eu percebi, pouco antes de uma coruja envolta por uma luz azulada acertar a cabeça da bruxa com o bico e entrar voando em minha casa, pousando ao meu lado. Tie passou por cima de minha prima (não literalmente, ele passou ao lado dela.), ajoelhando-se no local onde eu estava ajoelhada. — Vi a raposa entrando em sua rua e resolvi esperar. Ouvi os barulhos pouco tempo depois... Você está bem?
Queria saber exatamente que barulhos ele havia escutado...
— estou sim, mas... Paul...
— Paul está morto, e você é a próxima! — Gritou furiosa, ao mesmo tempo em que tentava se reerguer. — ME.DÊ.O.DIÁRIO!

(Continua...)

Lua escura - Parte 5

Parte de meu cérebro estava inacessível. Na verdade, a palavra certa era inviolável. Após tanto sofrimento ao lado de bruxos, anjos, espíritos e demônios, decidi que seria melhor para minha própria mente que eu “esquecesse” de tudo e nunca mais tocasse no assunto, independente do que acontecesse.
Tudo estava indo como planejado, e minha sensação de normalidade durou pelos próximos trinta minutos, quando a lua subiu ao céu solitário da cidade. Pelo que parece, a guerra espiritual lançou seus tentáculos para lugares que até a própria May nunca pensaria em investigar. Quem diria que teríamos ajuda de nossa decente, pura, e ingênua professora de sociologia?

---- Mickaella:

— Marianne? — A voz de Paul ecoou na entrada deserta do posto de gasolina. — Por onde esteve? E... Quem é a sua amiguinha?
— Alguém que arrumei para me ajudar em minha missão, já que o meu fiel companheiro resolveu colaborar com o oponente...
Com um arrepio desconfortante, percebi que nós éramos os tais oponentes. Marianne, estranhamente, nos queria vivos. Não, ela queria May viva, para que a pudesse sacrificar durante a guerra final. Mas... O que éramos nós? Eu realmente não entendia o motivo pelo qual esta esnobe dama de alta classe não havia ainda acabado com nossa raça. E isso, sim, acabava comigo.
— Percebi que estava do lado errado...
— Sim, você é o típico romântico incorrigível que escolhe ajudar aos “amigos” do que receber a própria libertação espiritual... — Ao dizer a palavra amigos, ela realmente tentou reproduzir as aspas com os dedos.
— Pode-se dizer que sim, Marianne... — Paul balançou a cabeça, em negativa, com um sorriso sarcástico no rosto. — E faço isso porque eu tenho amigos! E, quando digo isso, não estou falando apenas de um medíocre gato preto que mal liga pra minha existência. Eu falo de humanos, que mesmo sabendo desde o início de meus propósitos, ainda assim dariam sua vida por mim.
— Fique com eles, Paul. Fique até o momento em que você for descartável e te substituírem como fizeram com aquele maldito Riley...
O nome me fez gemer de angústia. Por um momento, pensei como ele estaria reagindo a esta terrível noite, sozinho. Lembrei-me então que ninguém havia avisado a ele os perigos do Halloween. Meu pavor dobrou de tamanho. Mas a discussão entre os dois encarnados continuava à minha frente:
— Quer dizer como você, não é? — Paul ficava cada vez mais vermelho, talvez de raiva. Seus punhos estavam cerrados, e seus olhos tão fixos em Marianne quanto os de uma coruja. — Enquanto eu cumpria suas ordens, protegendo o grupo do demônio das sombras, você fugia sei lá pra onde com o seu lindo e domesticado mascote!
— Você sabe muito bem que este não é o problema, Paul... Se tentasse me encontrar, sabe que me encontraria. Mas preferiu essa gente imunda! Hã... Mas você sempre foi assim... Desde a nossa geração! Ficou ao lado de Cloe e Celly... Max morreu por sua culpa! De todos vocês!
— Max morreu pelo simples fato de não acreditar no mundo a sua volta! — Agora, o garoto loiro literalmente berrava, como se ele fosse um copo de vidro e estivesse sido cheio com sua última gota de água. — Caso não se lembre, Mary, foi você quem o entregou à serpente e o deixou ser devorado quando viu que ela estava se aproximando!
—CALEM-SE! — A voz feminina de Celly chamou a atenção de todos nós, que agora a encarávamos perplexos.
Com um longo e solto vestido branco, que cobria suas pernas e impedia que víssemos seus pés, que parecia ser feito do tecido mais leve e confortável que já vi, a anja se aproximou do grupo. Seus cabelos estavam diferentes: agora eram castanhos e ondulados, e deveriam chegar a sua cintura. Seus olhos refletiam um lindo verde concentrado, que agora encarava sério as duas figuras que discutiam.
— A geração de vocês já passou! E, sinceramente, ninguém aqui liga muito para isso. — estranhamente, Celly ainda tinha poder. Eu o sentia, e era reconfortante. Quase me fazia querer sorrir. — Agora me escute, Marianne, não ouse interferir no destino! Se fizer algo contra May ou seus amigos, lembre-se que papai está olhando você, e eu duvido que ele permita que você entre em seu reino!
— E você, quem é? Uma maldita anja que eu mesma terei o prazer de mandar para o inferno! — Mesmo sabendo que nada poderia fazer, fiquei realmente nervosa quando Marianne, com suas unhas à mostra, avançou na direção de Celly, que sorria calorosamente para ela.
Quando pensei que a anja faria alguma coisa, Inna reagiu primeiro, o que me assustou. Minha amiga gótica já havia matado, a bem dizer, duas “pessoas” esta noite, e eu tinha que ela se arrependeria amargamente no dia seguinte.
—DEIXE CELLY EM PAZ! — Gritou, saltando em cima da mulher de vestido colado. As duas rolaram pelo asfalto, até pararem do outro lado, onde Inna literalmente socava a face de sua oponente inúmera vezes. Pela primeira vez em toda a minha vida, eu vi sangue saindo do corpo fraco de Marianne.
A mulher, enquanto apanhava, esticou o braço para algo que estava praticamente ao lado dela. Quando percebi do que se tratava, Paul já havia entrado no combate: Enquanto Inna paralisava a dama, o rapaz puxava o seu braço, retirando uma larga pedra pontuda de sua mão. Senti outro arrepio. Se Marianne tivesse acertado minha amiga com aquilo... Bom, então ela ficaria definitivamente ao lado de sua protetora anja, o que seria triste para todos nós.
Com uma imensa frieza, Inna se levantou e chutou com força o pescoço da dama. Ouviu-se um doloroso crack, e o corpo caído no chão parou de reagir. Após alguns segundos, a mesma mulher se desintegrou em uma grossa fumaça negra.
— Materializado? — Perguntou Paul, que parecia tão surpreso quanto eu.
— Merda. Tanto esforço para nada! — reclamou Inna, cruzando os braços enquanto Chilly escalava até seu ombro.
— Esperem um só minuto! — Pedi, pousando as mãos sobre a testa por alguns segundos. — Alguém pode me explicar o que está havendo? E... Porque não me lembro de nada disso em meus outros dias das bruxas?
Celly, com sua calma iminente, se aproximou de todos nós de forma tão leve e natural que me pareceu por um instante que o vento a carregava. Minha pele formigou quando uma de suas mãos tocou meu rosto... Quero dizer... Sua pele era como seda quente de tão lisa e confortante.
— Oh, minha jovem, gostaria de poder responder a sua pergunta... — Disse, e dessa vez senti uma leve pitada de preocupação em seus olhos. — Mas a verdade é que nem eu sei a resposta para isso. Nada disso está certo, querida. Antes de obter suas respostas, preciso descobrir como os mortais conseguem ver tudo que está acontecendo...
— A prioridade agora é encontrar meu filho! — disse a professora, com um olhar tão reprovador que senti minhas pernas bambearem um pouco. — Vamos procurar pela cidade inteira se for preciso. E começaremos imediatamente!
— Paul e Micka podem te ajudar com tal tarefa. — Afirmou Marianne, piscando para a mulher de aura revolta. — Mas gostaria de ter uma pequena conversa com estes três aprendizes... — Agora, ela alternava o olhar entre Inna, May e Tie. Sim, eu me senti um tanto excluída com isso, mas apenas a obedeci: Aproximei-me de minha professora ao mesmo tempo em que Paul o fez e observei enquanto a anja a nossa frente desaparecia, junto a meus três amigos e um animal, em um clarão branco de luz.
Os próximos minutos se resumiram em planos. Eu e Paul procuraríamos pelas residências abandonadas, enquanto a mulher passaria de igreja em igreja. Sim, eu também não entendia o que espíritos materializados poderiam fazer em uma igreja vazia em plena noite de halloween, mas resolvi não discutir. Já havia feito o suficiente para chatear aquela mulher.
— Uuuurrr... Uuuurrrr... — Piou algo de cima de um dos postes, estendendo suas asas e se aproximando do solo enquanto rodopiava ao nosso redor.
— Owllie? — Paul pareceu um tanto mais surpreso do que eu. Talvez até assustado, se observasse seus olhos com atenção. — Não deveria estar ajudando os outros a distrair Occino?
Meu coração saltou por um único, longo e medonho segundo. Quero dizer, todo e qualquer tipo de ser está sem poder nenhum enquanto um gigante do mundo dos mortos corre pelas ruas semidestruídas de Boston fazendo sabe-se-lá-o-que com quem encontra pelo caminho.
— Filha!
Virei-me para a esquerda e encontrei três silhuetas apressadas carregando algo que mais parecia uma mochila pesada. Graças a Deus, isso queria dizer que minha mãe estava sã e salva.
— Peguem! — Paula lançou o que quer que estivessem carregando e Paul, por pouco, não o deixou cair — Abram!
Aguardei até que o garoto loiro o fizesse e o observei tirar alguns objetos estranhos de lá. E isso incluía uma estaca de madeira e alguns bastões muito parecidos com aqueles utilizados pelos policiais. Ele me jogou um desses, apesar de eu nunca ter jogado beisebol em toda a minha vida. Enfim, pendurou a mochila em um dos ombros e disse:
— Como está a situação pelo caminho?
— Terrível... — respondeu Isa, guardando em seu bolso algo que parecia um isqueiro. — Calçadas não existem mais, casas pegando fogo ou simplesmente desabadas e fomos perseguidas por cinco pessoas diferentes. Sem falar que fomos atacadas novamente por aquela mulher medíocre que controla as aranhas. Teríamos morrido se aquela senhora, Madellyne, não tivesse chegado bem na hora.
— E isso não é tudo! — Gritou Paula com os braços cruzados, como sempre fazia quando estava frustrada com algo ou queria atenção de alguém. — Havia corvos na casa de Jennifer, e eles tentaram... Devorar-nos! Bem, pelo menos eu acho. Era como se eles fossem dezenas de chaves e outros objetos de metal voador e nós três fossemos um conjunto de imãs gigantes com pernas e braços!
— E aqueles idiotas quebraram o último conjunto de esmaltes fosforescentes que eu trouxe para Boston! — Rosnou Isa, agora batendo com um dos pés no chão. E só então percebi que ela usava sua bota negra de salto que se erguia até a canela, que eu não via há muitos anos. — Sem falar que meus batons vermelhos estavam juntos com aqueles malditos potinhos coloridos!
— Escutem, escutem! — Chamou Paul, para que ambas as garotas parassem de tagarelar tanto. Pela primeira vez na noite toda, eu agradeci a ele por algo que fez. — São meia-noite e meia. Isso quer dizer que os mortos só têm mais meia hora de liberdade até que os portais se fechem!
Portais...
Certa vez, em meio a uma conversa na velha mansão abandonada, Paul me disse que todo e qualquer portal se abriria para o nosso mundo durante a guerra do eclipse. Por um segundo, imaginei como serão as coisas quando os espíritos aprisionados — aqueles que não têm permissão para vir a este planeta — estivessem perambulando por aqui junto a anjos, demônios e encarnados lutando pela própria “sobrevivência”. A imagem de milhares de Occinos juntos a centenas de materializados não agradou muito minha barriga, pois ela começou a se remexer.
— Onde estão May e os outros? — Perguntou minha mãe.
— Com Celly. — Respondi. — Não sabemos para onde foram ou porque apenas os três foram com ela... — Revelei, ainda me sentindo excluída por tal acontecimento. — Mas devem estar seguros com ela.
— Precisamos nos esconder por algum tempo até que tudo volte ao normal. — sugeriu Paul. — Provavelmente não se lembrarão de nada disso daqui a alguns minutos, então não se preocupem!
— O que? — Gritei, adicionando um tom de injustiça à atmosfera. — Vamos esquecer de tu... Espere, e você?
— Sou um encarnado, Micka, — Lembrou-me o rapaz loiro. — Já sei de muita coisa que não deveria saber. Os anjos do tempo não se preocupam mais comigo... Não sou mais vivo para que escondam algo de mim.
Percebi que ele não se orgulhava disso, assim como eu estava realmente irada por saber que alguém tocaria em minhas memórias. Mas Paul parecia bem pior do que eu. De certa forma, acho que ele gostaria de estar realmente vivo. Vivo como... Qualquer um de nós. Nós, que não damos valor ao que realmente importa. Nós, que vendemos a vido por coisas tão superficiais... E, de alguma forma, na disso importa na hora que deixamos este mundo.
Nós... Não levamos dinheiro, diamantes, celulares... Nada. Não seremos ninguém mais uma vez. Ah, percebi o quão egoísta tenho sido durante toda a minha vida. O quão egoísta todos tem sido. Ninguém enxerga o que devemos mesmo dispensar e o que devemos aprender.
Agora, olhando para a face arrependida por trás daqueles olhos azuis que tanto me atormentavam, percebi o que estava faltando...
Paul estava em uma bela emboscada... Uma armadilha própria mais perigosa do que a que qualquer um de nós pensou em um dia possuir. Ele, preso a este mundo para sempre pelo simples fato de nunca ter a devida coragem para cumprir sua missão.
Não, ele nunca faria isso...
Nunca tocaria um dedo em May que fosse para feri-la...
Jamais...

(continua...)

O quarto do Tie:

------ Tie:

Senti o frio percorrer todo o meu corpo assim que abri a porta de meu quarto. Olhei ao redor, havia algo de muito errado aqui...
- Tie... - Sussurrou uma voz às minhas costas, fazendo meus pelos se eriçarem quase imediatamente. - Hayley está com problemas, e precisa de sua ajuda!
Girei em cento e oitenta graus e encontrei os olhos frios e preocupados de May, que segurava com força seu diário de couro como se o vento pudesse levá-lo embora a qualquer instante.
- Teve contato com Hayley? aquela Hayley da escola paranormal? O que... O que houve? - Observei as lágrimas da menina se prendendo em seus olhos, tentando evitar sua queda.
- A guerra começou, Tie... - Disse, por fim, deixando o líquido cristalino escorrer por seu rosto gelado. - Precisa entrar no blog "Elementares" e entrar em contato com ela! IMEDIATAMENTE!

Cavalos Alados - Jorge Castro

Senhor... Porque não fazes de minha vida um sonho?
Diga-me, ó pai, por que fizestes tudo tão real?
Porque não me crias um lugar que puxe meu sorriso tanto quanto a minha mente?
Caso não tenhas percebido, aspiro por magia, cada dia mais.
Vivo apenas pelo surreal, o impossível.
E, no entanto, vejo-me contentando-me com uma máquina cinzenta.
Um ser robótico que, incrivelmente, fornece-me ar...
Seu ar sem cor e sem voz, que tenta me manipular assim...
Se me tiras a magia, ó pai, tira-me mais que a vida.
Assim, sem escudos reluzentes, sinto-me mais que vulnerável.
Sem minha humilde rocha d’água, sou incapacitado de guerrear.
Guerrear contra a monotonia que se alastra com tentáculos nas sombras.
Guerrear pela luz do cetro que flutua dançante sobre a floresta esquecida.
E, ainda assim, percebo que me foi tirada a espada,
Roubada, dos trovões, a adaga. E levada, do mundo, a mágica.
Reparo, então, no pequeno canto cinza que luto para que se vá.
Mas, como o resto da tempestade, o pequeno insiste em ficar.
E, sem meu cetro ou a pedra d’água, não posso sequer tentar.
Senhor, ainda assim, te suplico...
Não tire a mágica que sinto, ou sei que não vou mais voltar.
Devolva-me o escudo polido, eu suplico, que com o cetro eu ei de usar.
Purifique a espada cansada, pai, antes de o cetro me tirar...
E me faça uma nova pedra, senhor, que a antiga sem mágica está.
 

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